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Exposição em Salvador reescreve a história da arte com corpos negros no centro

O artista beninense Roméo Mivekannin chega ao Brasil com a impactante exposição “O Avesso do Tempo”, que será exibida no Museu de Arte Moderna da Bahia (MAM-BA), em Salvador, entre agosto e novembro de 2025. A mostra faz parte da programação da Temporada França-Brasil e traz ao público uma série de obras que questionam os protagonistas da história da arte ocidental.

Mivekannin recria pinturas clássicas de museus como o Louvre, em Paris, mas com um novo olhar: em vez das figuras brancas que tradicionalmente ocupam o centro das composições, ele insere a própria imagem – um homem negro – no lugar delas. As obras são feitas sobre lençóis reutilizados de brechós europeus, que passam por um processo ritualístico de purificação com ervas antes de receberem a tinta. Cada tela se torna, assim, um espaço de reescrita e afirmação de identidade.

Entre os trabalhos em destaque está a releitura de A Balsa da Medusa, de Théodore Géricault (1819). No lugar dos rostos dos sobreviventes do naufrágio que inspirou a obra original, Mivekannin aparece retratado, ressignificando a narrativa e provocando o público com perguntas fundamentais: Quem tem direito à memória? Quem está sendo pintado? Quem está ausente?

“Ele se insere para reescrever a história e propor a sua própria narrativa”, explica Evelyne Reboul, gerente de atividades educacionais do Museu Louvre Lens, onde a mostra foi exibida entre dezembro de 2024 e junho de 2025. “É um convite para que o público também reflita sobre os sistemas de dominação ainda presentes e reescreva suas próprias histórias.”

Mivekannin nasceu na Costa do Marfim em 1986 e vive entre a França e o Benin. Formado em arquitetura, passou a pintar em 2019, influenciado pela exposição O corpo negro, de Géricault a Matisse, no Museu d’Orsay, que discutia a presença negra na arte ocidental. Ele também é descendente direto do último rei independente de Daomé (atual Benin), Behanzin – seu tataravô.

A religiosidade vudu, originária do Benin, também permeia sua obra. Em algumas telas, ele costura cartas pedindo permissão aos personagens das obras originais para ocupar seus lugares — um gesto simbólico e espiritual de respeito às figuras retratadas e às energias evocadas.

Entre outras obras marcantes da exposição está a releitura do Retrato de Madeleine (1800), de Marie-Guillemine Benoist. Na versão de Mivekannin, é ele quem aparece com o turbante, olhando diretamente para o observador. Durante muito tempo, essa pintura foi intitulada apenas como Retrato de uma mulher negra, até que, em 2019, a personagem foi finalmente reconhecida como Madeleine, uma ex-escravizada de Guadalupe que viveu na França após a abolição.

Com sensibilidade e contundência, Mivekannin reescreve não apenas imagens consagradas da arte europeia, mas também os papéis de quem pode ocupar espaços de poder, beleza e memória. A exposição no MAM-BA promete ser uma das mais provocadoras e necessárias da temporada.

As informações são da Agência Brasil.

Foto: Divulgação.